Letra Nova

Sylvia Plath nunca foi santa

A nova biografia Ísis Americana mostra que a imagem de mártir não combina com a mulher ambiciosa e problemática que se tornou a maior poeta de seu tempo


Luís Antônio Giron, do cmais+ Literatura

07/05/15 20:21 - Atualizado em 08/05/15 11:10

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São várias as biografias de Sylvia Plath (1932 -1963), a poeta americana famosa pelos livros Colossus (publicado em 1960) e Ariel (de1965). A imagem predominante que as biografias mostram é a da santa explorada pelo marido mau – o poeta inglês Ted Hughes –, a vítima pura, cheia de amor e de abnegação. Sylvia seria a deusa da poesia, a incorruptível diva americana perdida nas charnecas inglesas. Mas há outras versões. De fato, há tantas biografias quanto biógrafos. Estes não passam de moluscos que se nutrem da fama alheia de alguns poucos eleitos.  

A biografia Ísis Americana: a vida e a arte de Sylvia Plath, (Bertrand Brasil, 392 páginas, R$ 55,00), de Carl Rollyson, merece atenção e respeito. Trata-se de um livro especial, pois o biógrafo pesquisou em fontes inéditas. Uma delas é a correspondência entre Sylvia, o marido e a mãe, com a qual mantinha uma relação ambígua. Rollyson lança uma luz nova sobre a figura da escritora. O livro merece ser lido, pois lança a luz uma nova mulher, bem distante da santa endeusada em algumas obras biográficas anteriores.

Carl Rollyson é PHD e professor de Jornalismo da Universidade de Toronto. Publicou várias biografias como as de Marilyn Monroe, Martha Gellhorn e Susan Sontag. A nova versão que ele apresenta de Sylvia é de uma pessoa tão envolvida com seu destino de escritora que sobrou pouco tempo para as outras pessoas. O que o leitor encontra é uma mulher ligada ao mar desde a infância, obcecada pela imagem do pai e suicida vocacional.

Sylvia foi um mito de beleza para seus contemporâneos. Loira, 1,75 metro, grandes olhos escuros e lábios carnudos, sua presença se impunha. Como se não bastasse, era vivaz, irônica e sarcástica. Ela teve muitos casos amorosos numa época em que era raro uma mulher manter uma vida mais livre. Mas, no fundo, estava em busca de um marido. E achou no francês baixinho Richard Sassoon o par amoroso ideal. Mas Sasson a rejeitou. E foi assim que ela voltou às atenções para Edward James Hughes (1930-1998), conhecido como Ted Hughes, poeta e escritor de livros infantis britânico, considerado pela crítica como um dos melhores poetas de sua geração. Ela se casou cm Hughes aos 26 anos, e ficou com ela até os 32. O casal teve dois filhos: Frieda, nascida em 1960, e Nicholas (1962-2009). A biografia revela uma inimiga até então desconhecida de Sylvia: a  irmã de Ted, Olwyn Hughes, que teve uma relação próxima com o irmão e se tornou sua  agente literária e mais tarde herdeira do espólio da poeta. Ela odiava a cunhada – e era correspondida.

A vida conjugal de Sylvia foi conturbada, assim como sua vida anterior com a mãe. Por causa das relações familiares turbulentas ela havia tentado o suicídio aos 20 anos. Rollyson associa a vida de Sylvia à de outra deusa americana, Marilyn Monroe, de quem Sylvia era fã. Ele compara o casamento de Silvia e Ted com o de Marilyn e o dramaturgo Arthur Miller. Os dois maridos, brilhantes artistas, não conseguiram conviver com as neuroses das modernas divas. Eram elas ou eles, não havia escolha. Obviamente, eles escolheram viver a liberdade e destruíram suas amadas.

Depois de seis anos de casamento, Hughes se apaixonou por uma amiga da família, a alemã Assia Wevill (1927-1969), que fugira dos campos de concentração nazistas. Sylvia soube do novo amor por um telefonma de Ted, quando se encontrava na fazenda situada em North Tawton, em Devon. Pouco tempo depois, ela se suicidou, colocando a cabeça dentro do forno a gás. Na hora da morte de Sylvia, os filhos de Sylvia brincavam no segundo andar de sua nova casa em Londres, na rua Fitzroy n° 23, no prédio onde o poeta W. B. Yeats havia morado. Hughes continuou a morar lá com Assia, até ela se suicidar, usando o mesmo método adotado por Sylvia. Hughes não pareceu se abalar por suas mulheres autodestrutivas e levou uma carreira literária de sucesso até morrer.

Sylvia Plath vale a pena ser conhecida, tanto por seus poemas densos de metáforas imprevisíveis e sonoridades dissonantes como por suas fixações. Uma delas era o amor por Marilyn Monroe. Citou tanto a atriz em seus textos que os editores pediram que ela cortasse os excessos. Talvez o biógrafo tenha abusado desse detalhe, por ser um material de sobra da biografia que ele escreveu de Marilyn. O que domina no livro é a tenacidade com que Sylvia Plath, a despeito do temperamento insuportável e da depressão óbvia, levou ao limite seu projeto artístico, superando o marido e todo o círculo de grandes que a circundavam e muitas vezes desprezavam o seu trabalho. Segundo Rollyson, Sylvia desenvolveu noções de superação, dignidade e sobrevivência herdadas da família alemã, virtudes estranhas para os jovens americanos bem-nascidos com quem estudou, conviveu e que foram sempre fascinados por seu carisma. 

Leia a introdução de Ísis Americana: a vida e a arte de Sylvia Plath

Capa de Ísis Americana: a vida e a arte de Sylvia Plath

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