Rio de Janeiro

Arte & Cultura

15/10/12 18:19 - Atualizado em 15/10/12 18:43

A Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência do Rio de Janeiro começou em 1920, com um abrigo para meninas órfãs. O trabalho tinha esse viés assistencial, mas estava voltado para essas meninas que não tinham vínculo familiar, naquela época. Em 1983, houve uma mobilização intensa de pais, funcionários e familiares pela municipalização do Lar-Escola Francisco de Paula, que realmente tornou-se uma fundação municipal, e muitos, talvez, conheçam por Funlar-Rio.

Em 2004, foi criada a Secretaria Extraordinária do Deficiente Cidadão. A instituição deixava de ser a Fundação Municipal Lar-Escola Francisco de Paula para ser uma Secretaria Municipal. Em 2007, a secretaria deixou de ser extraordinária, passou por um processo de reorganização diretiva e passou a ser a Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência. Portanto, como Secretaria, na realidade, a SMPD existe somente há dois anos, mas como instituição que presta atendimento à pessoa com deficiência, a sua história é bem longa. As primeiras ações realizadas em unidades da Secretaria, de grande porte, localizam-se nos bairros de Vila Isabel e Campo Grande e foram ações centralizadas.

Na unidade de Vila Isabel, há gerências voltadas ao desenvolvimento das pessoas com deficiência, que chegam desde bebês, desde os três meses de idade, até a faixa etária adulta. Nessas unidades de grande porte, há uma gerência de desenvolvimento global inclusivo, que inclui uma das maiores creches do Brasil atualmente, com quase 300 crianças, com e sem deficiência, convivendo num cotidiano de muita diversidade e muito respeito. Dentro dessa mesma gerência, há um serviço de estimulação ampliada, onde são atendidas crianças com e sem deficiência, porque, na realidade, a unidade de Vila Isabel se localiza dentro do Morro do Macaco, com uma população bastante vulnerável. Assim, a estimulação ampliada atende crianças com deficiência e crianças em situação de risco social iminente.

Ainda nas grandes unidades, a gerência do mundo do trabalho atende a pessoas acima dos 14 anos de idade, com a perspectiva de incluí-las, de trabalhar para que elas sejam de fato incluídas no mundo do trabalho. E, obviamente, há um serviço de reabilitação também, pois a missão da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência é reabilitar para incluir. Essa é a sua principal missão, desenvolvida num eixo de articulação e num eixo de execução. A SMPD executa o atendimento da pessoa com deficiência, mas também tem a missão de induzir a política, no município do Rio de Janeiro, para que de fato as pessoas com deficiência tenham seus direitos garantidos.

No ano de 1992, inaugurou-se mais uma unidade de grande porte, em Campo Grande, com os mesmos serviços, as mesmas ações e as mesmas gerências. Em 1995, foi lançado o programa de Reabilitação Baseada na Comunidade, o RBC, a primeira ação descentralizada da SMPD. Hoje, o RBC está em mais de 600 comunidades do Rio de Janeiro e é composto por profissionais da área da reabilitação e da assistência que, em parceria com o Programa de Saúde da Família, vão até as casas e batem à porta das pessoas com deficiência, levantando as suas demandas e encaminhando essas pessoas para as políticas setoriais. É um trabalho em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde, que tem tido bastante êxito no sentido de incluir as pessoas com deficiência, que muitas vezes não conseguem sair das suas comunidades e chegar ao
asfalto, para que essas pessoas possam de fato ter garantidos os seus direitos, seu atendimento em reabilitação, a sua inclusão nas políticas sociais.

Há dez anos, com a inauguração da primeira Casa-Lar, iniciava-se um trabalho em parceria com o Instituto Franco Basaglia, na lógica da desospitalização de pessoas que viviam em condições sub-humanas, numa instituição do Rio de Janeiro, o Centro Educacional Deolindo Couto. A intervenção foi feita por imposição do Ministério Público, pois as pessoas viviam ali em situação degradante, asiladas, em total exclusão. Com essa ação, nascia a primeira Casa-Lar, retirando as pessoas daquele espaço excludente para um espaço de residência, onde os moradores tiveram garantidos seus direitos de residência, de frequentar uma escola, espaços de reabilitação, atividades de cultura, esporte e lazer. Assim, a primeira Casa-Lar foi inaugurada em 1999, no bairro do Grajaú. É um trabalho no qual são atendidas dez pessoas em cada equipamento, pois é preciso preservar o espaço de convivência, de moradia.

Pode parecer pouco para uma política pública, mas é preciso garantir que os usuários convivam num espaço de moradia, portanto não seria adequado utilizar um espaço de dimensões muito grandes. Também no ano de 1999 passou a ser concedida, em parceria com o Instituto Franco Basaglia, a bolsa-cidadã. As pessoas que estavam no Centro Deolindo Couto e tinham algum vínculo familiar puderam retornar ao convívio das suas famílias e passaram a receber um recurso, pago até hoje, para desospitalizar aquelas pessoas. Atualmente, o recurso se expandiu para as pessoas que vivem situações de iminente asilamento. A bolsa-cidadã e o projeto Casa-Lar protegem e previnem o asilamento das pessoas com deficiência.

Em 2002, surgiu outra proposta, em parceria com o Consulado da Itália: a Casa-Dia, cujos usuários têm vínculos familiares preservados, com certo esgarçamento e a iminente possibilidade de asilamento. A Casa-Dia surge também com finalidade preventiva, para que a pessoa tenha um espaço de garantia dos seus direitos, permanecendo oito horas diárias, na escola, nos espaços de reabilitação, de esporte, cultura e lazer. A responsabilidade é da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência, de ir e vir com a pessoa para os espaços em que ela precisa estar inserida. Há atualmente três Casas- Dia no município do Rio de Janeiro, cada uma com 20 pessoas incluídas. A lógica é garantir direitos, é a lógica da inclusão. Se aquela pessoa está com riscos severos, a família não dispõe de recursos, de ferramentas para estar com a pessoa em casa, seja por qual motivo for, o equipamento surge para prevenir o asilamento.

Há ainda o Passe Livre, que garante o transporte gratuito à pessoa com deficiência, marco na concessão de gratuidade do sistema de transporte rodoviário às pessoas com deficiência. Outro marco bastante importante para a Secretaria foi a inauguração do Centro Integrado de Atenção à Pessoa com Deficiência, em 2003. É bom frisar que os usuários da Casa-Dia, da Casa-Lar e da República frequentam todos esses espaços da Secretaria da Pessoa com Deficiência. É um trabalho marcado pela intersetorialidade: o CIAD dá concretude a essa lógica da política macro; são cinco secretarias dentro do mesmo espaço, responsáveis pela política de inclusão da pessoa com deficiência no Rio de Janeiro: Secretaria de Trabalho, Secretaria de Esporte e Lazer, Secretaria de Educação, Secretaria de Ciência e Tecnologia e SMPD. Há uma vertente dentro desse espaço, de execução direta pelo Centro Municipal de Referência, para o atendimento a crianças e adolescentes com autismo. O CIAD Mestre Candeia fica na Avenida Presidente Vargas, no centro do Rio de Janeiro. Em 2004, foi inaugurada a primeira República. O projeto surgiu a partir da necessidade de intervenção na fazenda-modelo, um espaço que abrigava população de rua. Ali, o trabalho entre as secretarias aconteceu de forma bastante interessante.   Secretaria de Assistência Social, juntamente com a Secretaria da Pessoa com Deficiência e a Secretaria de Saúde, por meio do Serviço de Saúde Mental, retirou as pessoas que ali estavam, também em condições precárias.

Na República, as pessoas já podem prover seu próprio cotidiano, têm um nível de autonomia maior. Cuidam da higiene da casa, da alimentação. É um espaço também bastante interessante. São quatro Repúblicas hoje, uma feminina e três masculinas.

A quarta Casa-Dia foi inaugurada na Rocinha, no Centro de Cidadania Rinaldo De Lamare. Além de Casa-Dia, é também um espaço cultural com ações de reabilitação baseadas na comunidade, atividades socioculturais das pessoas com deficiência, por ação da equipe de RBC. A SMPD existe não só para realizar o atendimento das pessoas com deficiência, mas também para induzir a política de inclusão dessas pessoas e garantir então os seus direitos. São resultados dessa atuação a rede básica de transportes, o ônibus adaptado e manual de transporte de deficientes, a regulamentação da paridade do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência, o CONDEF-Rio, telefones públicos para pessoas com deficiência, a Rede Cidadania e Trabalho, a participação nos Jogos Parapanamericanos, a orientação para adaptação de prédios residenciais, cursos para síndicos e administradores de imóveis, a capacitação de trabalhadores do sistema de transporte coletivo, do Metrô Rio, da SuperVia, da rodoviária e empresas aéreas, a capacitação dos profissionais da área de turismo, entretenimento e restaurantes, a Mostra de Arte Eficiente do RBC, uma mostra que mobiliza toda a cidade (os usuários das comunidades aguardam ansiosamente por esse momento), o manual de acessibilidade para a rede hoteleira, seminários de tecnologias assistivas, do esporte, inclusão social, cidadania e trabalho, o Congresso Internacional de Acessibilidade, o Carnaval da Inclusão, a capacitação de profissionais da cooperativa de táxi, o nosso website acessível, o Prêmio Parceria Eficiente (entregue todos os anos àqueles que se destacam na área das pessoas com deficiência) e os Jogos da Inclusão. Todos os moradores, todos os usuários fazem parte da proposta de trabalho da SMPD, que é uma proposta de inclusão, de garantia de direitos. Ela ainda não atende a uma quantidade tão considerável de pessoas, que merecem estar incluídas, residirem, ir e vir, mas já é um começo. O desafio atual é ampliar esses serviços, num processo de construção.

Isabel Cristina Pessoa Gimenes
ex-secretária Municipal da Pessoa com Deficiência - Rio de Janeiro, RJ

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