Ganhar o Man Booker Prize com um segundo livro – e aos 28 anos -, não é um fato comum. Esta foi a façanha de Eleanor Catton. A escritora neozelandesa nascida no Canadá conquistou em 2013 o Booker – o prêmio mais importante da comunidade anglofone – pelo romance Os luminares (Editora Globo). O livro é ambientado na região sudoeste da Nova Zelândia em 1866, no auge da corrida do ouro na região. O livro é organizado de acordo com os 12 signos do zodíaco e conta a história de um explorador, Walter Moody, que chega à região de Christchurch em busca de fortuna, mas encontra um amor e um assassinato misterioro. Ele tem de lidar com a obsessão pelo amor, pelo ouro e pela descoberta de um criminoso. Um livro grande (900 páginas) que é um grande livro.
Eleanor esteve na Flip e falou com Luís Antônio Giron para o cmais sobre como entende a força dos signos e o papel da literatura. Leia parte da entrevista e ouça o áudio na íntegra:
cmais+: Você nasceu no Canadá, mas vive na Nova Zelândia?
Eleanor: Sim.
cmais+: Em que cidade?
Eleanor: Auckland.
cmais+: Eu conheço Christchurch, que você descreve no livro, é um lugar muito bonito.
Eleanor: Sim, eu cresci lá.
cmais+: É fantástico! É um país pequeno, imagino que para você isso tenha sido um motivo para escrever. De escritores eu só conheço a Katherine Mansfield, de Wellington, e agora você. Você é a segunda.
Eleanor: É um país com uma história curta na literatura. Katherine Mansfield foi a primeira escritora conhecida, há poucos escritores da Nova Zelândia que foram publicados internacionalmente. Agora está mudando, mas é muito empolgante porque nós estamos no começo da história da nossa literatura, nós ainda podemos fazer o que quisermos.
cmais+: E o fato que você conhece o lugar onde o livro se passa...
Eleanor: Na região sudoeste.
cmais+: Isso te ajudou a escrever, já que você conhecia bem essa região, ou é impressão minha?
Eleanor: É uma região da Nova Zelândia que eu amo, eu já fui muito lá, minhas irmãs moraram lá por muito tempo. Passei muito tempo lá, fazendo caminhada e coisas do tipo. A parte interessante da Nova Zelândia é que é muito isolada, e quando o ouro foi descoberto em 1866, a cidade era no meio do nada, era difícil de chegar, o oceano ao redor era perigoso...
cmais+: Nós nunca imaginamos que um lugar tão bonito e tranquilo fosse na verdade uma fonte de ouro. Eu nunca imaginei, talvez seja ignorância... Mas o assunto do seu livro é fantástico, é algo que ninguém sabe.
Eleanor: É verdade, poucas pessoas sabiam que houve uma corrida pelo ouro na Nova Zelândia.
cmais+: Mas esse episódio é parte da história do país. É bem diferente da corrida do ouro da Califórnia.
Eleanor: Até na Austrália foi diferente. A legislação daqui em relação ao ouro aprendeu com os erros que foram feitos na Califórnia e em outros lugares. Quando a corrida do ouro começou em 1866, as autoridades já estavam mais preparadas. Você tinha que ter uma licença para escavar, quase não tinha como evitar as taxas etc. Foi ótimo para mim, eu queria escrever um mistério e todos os crimes que eu estava lendo sobre a corrida do ouro eram crimes de fraude. Não havia assassinatos... Quando você pensa no que aconteceu na América, havia pessoas fugindo das cidades... Os crimes que aconteceram na Nova Zelândia eram muito mais calculados, muito parecidos com os que acontecem hoje, não era pelo assassinato e sim para lucrar.
cmais+: O lucro e as drogas, como na guerra do ópio. Quando eu imaginaria que a guerra do ópio faria parte dessa situação? É ótimo.
Eleanor: Pois é, o ópio não era ilegal, ele só se tornou ilegal muito mais tarde na Nova Zelândia, por volta de 1900. Na verdade, virou ilegal parte por causa do grande número de chineses, junto com várias leis racistas aprovadas na época por volta da virada do século. Eu estava muito interessada nesse período da história, porque é uma guerra chocante.
cmais+: E como surgiu a ideia de escrever um livro sobre esse episódio?
Eleanor: Eu estava bem intrigada pela ideia da corrida do ouro, sempre pensei que seria interessante. Foi só na década de 20 que pessoas como Katherine Mansfield apareceram e começamos uma literatura nacional, então nada foi escrito sobre aquela época.
cmais+: Mas existem algumas coisas sobre...
Eleanor: Sim, escritas hoje, mas nada que foi escrito naquela época.
cmais+: Como você pesquisou sobre o assunto?
Eleanor: Eu li muitas novelas do século 19, mais ficção do que não ficção, há muitas coisas que você pode aprender com as ficções dos períodos, porque são o contemporâneo daquela época. Eu li também muitos jornais da época, o que foi uma ótima fonte que eu consegui da Biblioteca Nacional da Nova Zelândia. Poder sentar e ler um jornal de 1866 é fantástico.
cmais+: Então é verdade que você passou dois anos estudando e só seis meses escrevendo o livro?
Eleanor: Não, foram dois anos de pesquisa e três anos para escrever.
cmais+: E o personagem principal, Walter Moody? Como você o inventou? Ele parece real, há algo nele que é real historicamente?
Eleanor: Nenhum dos personagens foi baseado em pessoas reais. Com o sistema astrológico do livro, ele representa Mercúrio, o deus mensageiro. Como planeta, Mercúrio governa nosso senso de razão, lógica e línguas, colocar as coisas na ordem, dar sentido às coisas. Então fez sentido para mim que um assassinato misterioso com uma figura de detetive teria que ter uma influência de Mercúrio. O Moody se envolve nesse mistério e tenta achar uma solução, esse é o papel dele.
cmais+: É virgem o signo, né?
Eleanor: Sim.
cmais+: Ele é ao mesmo tempo o cara que está procurando o ouro e solucionando o mistério. É um personagem muito rico. Como você conseguiu pensar em toda a saga, os personagens e interligar as coisas? Parece ser muito difícil, mas você consegue concluir todas as histórias.
Eleanor: Leva muito tempo e eu acho que há vários tipos de abordagens que você precisa fazer. Muitas vezes, enquanto eu estava escrevendo, eu me deparava com um problema que eu ficava semanas pensando sobre e não conseguia resolver. Eu tinha que voltar para o começo e mudar alguma coisa lá para que fizesse sentido. Eu tinha que ficar indo e voltando. É preciso ter muita paciência.
cmais+: Eu acho que é difícil lidar com tantas situações ao mesmo tempo.
Eleanor: Sim, e você precisa tomar cuidado para nada escapar. Quando você muda uma coisa, outra fica impossível. Você precisa pensar de várias formas, você precisa estar dentro da cena e também fora dela, não só ser um membro da orquestra, mas também o maestro. Você precisa se colocar em vários níveis de distanciamento.
cmais+: Você sabe sobre música?
Eleanor: Um pouco, eu aprendi piano quando eu estava crescendo.
cmais+: Você comparou música com o zodíaco ontem à noite. Por que usar o zodíaco? Foi uma estratégia de narrativa, construção? Parece algo místico.
Eleanor: Eu acho que é. Um psicólogo uma vez chamou a astrologia de “psicologia ingênua”, porque são previsões do nosso subconsciente baseadas no céu. Muito disso é acidental, na verdade, é por um acidente que a terra gira um pouco fora do eixo que nós temos estações... É um acidente à disposição das estrelas no céu. Mas também há aquela coisa, o céu é assim há anos, milhares de anos, nós procuramos significados nos padrões, fazendo com que agora haja algum significado.
cmais+: Você não estava interessada nisso antes do livro, certo?
Eleanor: Eu não sabia muito sobre, eu era como a maioria das outras pessoas, sabia um pouco sobre o meu próprio signo e quase nada sobre o resto.
cmais+: Qual é o seu signo?
Eleanor: Libra. É muito interessante, porque o zodíaco é como música, é um sistema que não faz sentido se você só olhar uma parte, você precisa ver tudo para apreciar de verdade.
cmais+: Isso traz uma harmonia para o livro, porque quando o leitor acompanha a narrativa, ele fica envolvido por essa constelação de símbolos, o mistério da saga, de tudo o que está acontecendo. É incrível esse aspecto do livro. Você acha que o seu livro poderia ser interpretado como uma metáfora de ganância? Porque isso afeta muitos personagens, a ganância, o desejo de ter o ouro.
Eleanor: E também para ter a Anna, eu acho. É uma visão da mesma coisa, eu acho que todos os homens que têm o sinal do zodíaco, os 12, a querem e eles ficam frustrados por não conseguirem. Há algo nela que não dá para ter. Diferente da relação dela com o Emery, porque ele não quer nada dela, ele só a ama, é puro e fácil. Ele dá para ela um presente que acaba confundindo os outros homens, porque eles não conseguem entender o presente. Para eles, dinheiro é só para pagamentos e dívidas, eles acham que não tem nada a ver com presentes ou tentar fazer do mundo um lugar melhor.
cmais+: Que é algo parecido com o mundo hoje em dia.
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O homenageado desta edição é o dramaturgo, editor, tradutor e artista gráfico Millôr Fernandes. Uma das figuras mais marcantes da imprensa brasileira recebe destaque em Paraty dois anos após sua morte, em março de 2012, aos 88 anos.
O editor, jornalista e curador da Flip 2014, Paulo Werneck, falou ao De volta 'pra' casa sobre a escolha. "Ele era um tradutor de Shakespeare, de Ibsen, um cartunista genial que rivalizava com Steinberg, que é o maior nome do cartoon do século 20, um humorista, autor de livro infantil... Ele fez de tudo. Para mim ele é a cara da Flip, esteve até na primeira edição".
Considerado uma "pedra no sapato do poder" durante sua carreira, é também Millôr quem dá o tom na programação da tenda dos autores de diferentes nacionalidades, que destaca literatura, humor, arquitetura, ciência e pensamento indÃgena. Gal Costa abre o evento em Paraty com as canções de Recanto, seu disco mais recente, que mescla MPB, rock e música eletrônica. Clássicos como "Folhetim" e "Barato total" completam o show, que pela primeira vez na história da Flip será gratuito.
A programação completa você confere no site flip.org.br.
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Millôr Fernandes é o grande homenageado da 12ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Falecido em em março de 2012, o desenhista, humorista, dramaturgo, escritor e tradutor terá uma exposição dedicada a seu trabalho, com fotos, desenhos e imagens na Casa da Cultura da cidade. Intitulada Millôr - 90 anos de nós mesmos, a mostra tem abertura no sábado (26). Já a festa literária começa em 30 de julho e vai até 3 de agosto.
Millôr, considerado por Salomão Schvartzman "o guru" do Diário da manhã, foi lembrado no programa desta quarta (23). O apresentador trouxe célebres pensamentos do carioca e leu, na Ãntegra, o poema "Saudação aos que vão ficar". Confira.
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Os dias, os horários e os temas das mesas da Festa Literária Internacional de Paraty:Â
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O desenhista e escritor carioca Millôr Fernandes, morto em 2012, é o homenageado deste ano da 12ª edição da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty). E numa exaltação ao humor como grande gênero literário, Salomão Schvartzman destacou algumas frases célebres de Millôr na crônica desta sexta-feira (01) do Diário da Manhã. Confira.