Fredric Jameson fala da “estética da singularidade” na pós-modernidade

O crítico literário e professor de Literatura Comparada da Duke University Fredric Jameson abriu, na noite de 25 de maio, na Sala São Paulo, o ciclo de conferências “Fronteiras do pensamento”, que conta com o apoio da TV Cultura


Fernanda Gehrke e Jaqueline Nikiforos Educação

01/06/11 12:19 - Atualizado em 01/06/11 14:13

O crítico literário e professor de Literatura Comparada da Duke University Fredric Jameson abriu, na noite de 25 de maio, na Sala São Paulo, o ciclo de conferências “Fronteiras do pensamento”, que conta com o apoio da TV Cultura. A arte na pós-modernidade foi o principal tema da palestra “A estética da singularidade”, cujas primeiras palavras foram reveladoras do método do teórico marxista: “Pensar é pensar fora das caixas”.

De acordo com Jameson, a transição do modernismo para o pós-modernismo trouxe a prevalência do espaço sobre o tema na arte. Com isso, as concepções de arte e obra-de-arte mudaram completamente. “E essas mudanças vão muito além da reprodutibilidade técnica de Benjamin, culminando no desaparecimento de produtos artísticos antigos, como pinturas a óleo e estátuas”, afirma, referindo-se a artigo de Walter Benjamin (A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica).

As instalações são citadas por Jameson como signo da pós-modernidade na arte. Nelas, o espaço não pode ter um estilo em si, no sentido antigo. “A obra é a ideia, não existe mais um estilo próprio, o que torna a instalação diferente do sistema clássico antigo, das chamadas belas artes”, explica.

Nem mesmo o ícone da pós-modernidade, Andy Warhol, escapou às observações de Jameson. “O que esse tipo de arte busca é uma estratégia de promoção, essas obras marcam a inovação, mas não têm um estilo em si e sim um estilo de produção”, define.

Outra forma de expressão artística abordada por Jameson é a fotografia. “No pós-moderno, as artes se mesclam e se misturam e essa é uma simbiose nova e inesperada. A fotografia, por exemplo, que quando surgiu era o primo pobre da pintura, hoje ocupa posição relevante no mercado de arte”, aponta, definindo a fotografia como abstração visual, tátil e pictórica. “A busca pela densidade única não é mais uma ambição viável”, arremata.

Para Jameson, as artes não têm mais pujança individual e as vanguardas coletivas foram substituídas pela figura individual do curador, gerando o que ele chama de constelações flutuantes da arte. “A efemeridade das instalações e exposições cria essa nova forma de arte que não é um objeto, é um evento”, descreve. “Hoje, o computador e a internet substituíram o consumo artístico e cultural antigo, agora possuímos a forma da comunicação, além do seu conteúdo”, diz.

Para exemplificar sua teoria, Jameson citou alguns artistas, entre eles o autor polonês Stanislaw Lem, que publicou, na imprensa, críticas de livros ainda não publicados. “Ele provou que qualquer um de nós poderia consumir a idéia de um livro com tanta satisfação quanto um livro em si”, conta. Outra experiência citada é a culinária molecular do restaurante El Bulli. “Você consome a imagem junto com a ideia, as invenções e receitas são fotografadas, as novas texturas e cores da comida criada em laboratório são uma nova forma de arte”, descreve.  

Primazia do espaço

Para Jameson “a pós-modernidade inaugura o deslocamento da experiência do tempo para o espaço”. Segundo ele, “com a hegemonia do capital financeiro, espaço abole o tempo”. A partir dessa constatação, surge o desafio de pensar como é essa “nova temporalidade em função do espaço”.

Segundo o crítico, a virada do modernismo para o pós-modernismo se dá a partir do momento em que a modernização do espaço, que no período anterior constituiu um processo incompleto, torna-se completa. Para ilustrar esse movimento, Jameson usa como exemplo o “banimento do espaço rural”, cuja grande marca é a presença do grande empresário do agrobusiness em substituição à tradicional imagem do fazendeiro. Em tal conjuntura, marcada ainda pelo advento da globalização, alastra-se a comodificação da terra e dissolução dos últimos remanescentes do feudalismo.

Jameson enxerga essa pós-modernidade como uma “era de padronização”, em que o desenvolvimento irregular é global e cuja dinâmica abrange inclusive a cultura. “A passagem do tempo é virtualmente eliminada. O ‘antes’ e ‘depois’ tendem a desaparecer. Há o desaparecimento do roteiro”, aponta Jameson. Segundo ele, a memória segue esses mesmos passos. “A memória histórica de hoje é a pior de todos os tempos”, constata. Com a primazia do espaço, a subjetividade na pós-modernidade se reduz ao presente. “Resta o corpo resistindo à exaustão da cultura burguesa”.

O pensador salienta ainda que, nesse contexto, as instalações são um sintoma de um sentido de temporalidade que segue a “lógica do efêmero”, algo que é emblema da arte pós-moderna. “Com essa onipresença do presente, não podemos mais imaginar o futuro”, conclui.

(Foto: Greg Salibian)

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