O espírito rebelde de Alice Caymmi

Ousada e segura, a mais jovem cantora e compositora da linhagem dos Caymmi apresenta um dos grandes discos de 2014 em São Paulo


Felipe Tringoni, do cmais+ Música

18/11/14 16:12 - Atualizado em 18/11/14 17:29

Alice Caymmi (Foto: Daryan Dornelles / Divulgação)
Alice Caymmi (Foto: Daryan Dornelles / Divulgação)

A maturidade de Alice Caymmi dá as pistas erradas sobre sua idade. A segurança com que fala de suas decisões e referências para o segundo e mais recente álbum, Rainha dos raios, impressionam para uma garota de 24 anos de idade. Olhando em retrospecto, ela se considera “ainda uma menina” em 2012, quando lançou seu primeiro disco, em boa parte uma compilação de canções escritas durante a adolescência. Dois anos se passaram, mas parece que foram dez.

A bem da verdade, Alice Caymmi, o álbum de 2012, dava pequenas pistas do que estava por vir esteticamente. Nos timbres sintetizados e percussão eletrônica de sua versão de “Sargaço Mar”, de seu avô Dorival, e na fascinação pela islandesa Björk que dá o tom do disco como um todo, Alice mostrava uma certa vontade desbravadora. Ainda assim, Rainha dos raios chama atenção pela ousadia: além de ampliar suas ideias musicais, mostra segurança e amadurecimento da intérprete. “Eu já vinha buscando isso, mas acho que o Rainha foi uma ruptura. Não no sentido de ‘ah, quero ser diferente’. Foi um jeito que eu vi de me libertar.”

Aqui, ela comenta as diferenças entre um trabalho e outro e como situações que viveu nos últimos tempos a fizeram amadurecer. “Rainha dos raios admite certa melancolia, mas vem com uma força muito grande”, opina.



O novo álbum começou a ganhar corpo ainda em 2013, quando Alice se encontrou com Diogo Strausz – até então um “amigo de amigos” mais ligado ao universo dos beats eletrônicos do que à produção fonográfica. Produzida por Strausz, ela lançou o single “Iansã” – música de Caetano Veloso e Gilberto Gil, de famosa gravação de Maria Bethânia – e encontrou o espírito do trabalho futuro: uma personagem forte, a superação em pessoa, dentro de um novo e atrevido arranjo.

Alice comenta como deu início à parceria com o produtor e de sua importância para o trabalho: “esse garoto é outro esquema”.



A criatividade e o conhecimento musical de Strausz foram terreno fértil para as ideias que Alice somou às sessões seguintes. “Eu trazia as músicas já com todas as referências que queria. ‘Assiste a esse filme, lê este livro e ouve esta outra música’. Muitas coisas, de várias partes da arte”, lembra.

O restante do repertório foi escolhido de maneira despretensiosa e se liga com a “libertação” a que a cantora se refere. Libertação de gêneros musicais e de amarras de gravações originais – das nove faixas, sete são releituras. Da banda Tono (“Como vês”) a MC Marcinho (uma releitura torta e romântica do funk “Princesa”), de Maysa (“Meu mundo caiu”) a Caetano Veloso (além de “Iansã”, “Homem” e “Jasper”, esta uma parceria do baiano com Arto Lindsay, estão no disco), passando pelas inéditas “Meu recado” (parceria de Alice com Michael Sullivan) e “Antes de tudo”, as barreiras de gêneros são quebradas pela concisão da produção.



“Eu não me sentei pra pensar no repertório. Eu simplesmente trouxe músicas que eu amo e que fazem parte da minha vida. São músicas que eu ouço e brinco de cantar. A pretensão estraga tudo”, diz Alice.

Consciente do peso que carrega em seu sobrenome – a cantora segue fazendo shows em homenagem ao centenário de seu avô, como o desta sexta (saiba mais no Guia da Cultura) – a manobra de Alice em Rainha dos raios é ainda mais ousada. “Eu não gosto de ficar buscando a aprovação de ninguém. Tenho que fazer meu trabalho e pronto, acabou. Se eu fosse gravar Caetano pensando ‘ah, será que ele vai gostar?’, nunca gravaria nada.”

Alice não perguntou, mas Caetano Veloso fez saber recentemente, em declarações ao jornal argentino Clarín, que admira o trabalho da neta de Dorival. O recente prêmio Multishow de “Melhor versão do ano” para “Homem”, música do próprio Caetano, também veio como reconhecimento para um álbum, que, ao final de 2014, deve ser bastante lembrado como um dos melhores do ano no país.

O primeiro show de Alice Caymmi em São Paulo com repertório de Rainha dos raios acontece nesta quarta (19), no Tom Jazz. Mais informações no Guia da Cultura.

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