'Marco Polo': Relatos e fantasias na corte de Kublai Khan

Série estreia no serviço de vídeo-on-demand Netflix em 12 de dezembro


Marília Fredini, do cmais+ Arte & Cultura

19/11/14 12:14 - Atualizado em 24/11/14 10:37

Então o mestre Marco, filho de mestre Nicolau, estando por pouco tempo na corte, aprendeu os costumes dos Tártaros, a sua língua e suas letras e se tornou um homem sábio de grande valor. [...] “, tradução livre de Il Milione di Marco Polo (Ed. Einaudi, 1975)

 

As histórias de Marco Polo por muito tempo foram os relatos mais importantes e ricos sobre o oriente, sua geografia e civilizações. O explorador, natural da cidade italiana de Veneza, fez uma viagem de três anos ao lado de seu pai, Niccolò, e seu tio Maffeo,  seguindo a Rota da Seda, em 1271. Em caravanas, eles percorreram o oriente a partir da Armênia, seguindo até Bagdad. De lá, rumaram ao norte e à leste, passando pelo deserto de Lut e de Takamaklan e, depois, cruzando o Rio Amarelo (Huang Ho) até chegarem aos domínios de Kublai Khan, então Rei da Mongólia.

É a partir desse ponto que Marco Polo, série original da Netflix e da Weistein Company, começa a tecer os relatos originais do explorador à outras passagens fictícias, construindo uma narrativa envolvente aos moldes de séries como Os Tudors e Os Bórgias, recentes sucessos da televisão norteamericana e vencedores do Emmy 2010 e 2013, respectivamente. Com belíssima cinematografia e atuações bem preparadas, além da carga histórica importante, Marco Polo estreia em 12 de dezembro de 2014 exclusivamente no Netflix, em todos os países em que o serviço opera, aproveitando esse ótimo momento da narrativa seriada.

Os 10 episódios do drama foram filmados na Itália, Cazaquistão e Malásia. John Fusco, autor indicado ao Oscar por Corcel Indomável, é o criador e produtor executivo da série e dirige ao lado de Dan Minahan, que já trabalhou nas séries Homeland e Game of Thrones. Os diretores indicados ao Oscar, Joachim Rønning e Espen Sandberg, de Piratas do Caribe: Homens mortos não contam histórias, dirigiram os dois primeiros episódios e atuam como produtores executivos. O elenco global conta com Lorenzo Richelmy no papel de Marco Polo, o inglês Benedict Wong (Prometheus, Sunshine) como Kublai Khan, e Joan Chen (Twin Peaks) interpreta a esposa de Khan, Chabi Khatun.

Marco Polo - Netflix

Baseado diretamente nos relatos de Marco Polo, o roteiro mostra um explorador jovem e inexperiente, que consegue a confiança do temido Kublai Khan por conta de suas qualidades: observação, curiosidade e capacidade de aprendizado. Por vinte e sete anos, Marco Polo serviu ao rei mongol como conselheiro e embaixador. No retorno à Itália, foi feito prisioneiro da República de Gênova após a Batalha de Curzola e, na reclusão, ditou suas memórias a Rustichello da Pisa, escritor italiano encarcerado catorze anos antes. Esses relatos foram compilados e traduzidos para o latim em 1315 e, com a invenção da prensa um século depois, se espalharam pela Europa, ditando os rumos das grandes navegações, que levaram ao descobrimento da América. Por séculos, os relatos de Marco Polo permearam o imaginário ocidental com detalhes das cortes orientais, seus hábitos e costumes.

 

Confira o trailer da série Marco Polo, da Netflix

Na série da Netflix, os relatos de Marco Polo ao Grande Khan, no entanto, carecem de mais riqueza de detalhes, tanto na fala quanto nas imagens, perdendo a oportunidade de carregar de mais subjetividade o retrato de uma sociedade totalmente exótica para um italiano do século XIII. Algumas passagens com lutas e treinamentos de artes marciais trazem um pouco de fantasia à veracidade do enredo, seguindo a estética consagrada de O Tigre e o Dragão, e carregando a série de elementos já banais nos dramas baseados na cultura oriental, mas não desagradam. Como o próprio Dan Minaham ressalta, “suas histórias são tão lendárias que há diversos ângulos para se trabalhar [...] é parte mito .e parte histórico”.

A qualidade cinematográfica da série é altíssima: fotografia, figurino e direção de arte são dignos de grandes produções de Hollywood e a intenção é concorrer com a HBO no nicho de Game of Thrones, terreno ainda não explorado pelas produções originais da Netflix, mas do qual certamente tem os dados de audiência necessários para investir em um grande orçamento e atores globais. Vale lembrar que a riqueza de informações a respeito do comportamento de sua audiência foi fundamental para a grande virada na indústria do entretenimento que a Netflix comandou, passando de aluguel de VHS a domicílio para o principal pesadelo dos grandes estúdios e canais de televisão com a implantação de seu serviço de streaming em 2007, nos EUA e o recente investimento em produções originais.

Seguindo os moldes dos últimos lançamentos de conteúdo original do serviço de video-on-demand, todos os episódios da série estarão disponíveis para o público ao mesmo tempo, incentivando o binge-watching (termo em inglês que caracteriza o consumo de séries e filmes em grande quantidade, por vezes assistindo à uma temporada inteira em um único dia). A estrutura narrativa, fragmentada em alguns momentos, promove um binge-watching mais “insolente”: as viradas dramáticas, principalmente ao final dos primeiros episódios, não formam na audiência aquela “necessidade” de assistir ao próximo episódio logo para saber os rumos da história. A série House of Cards, primeiro conteúdo original da Netflix, é um bom contraponto nesse sentido, por ter como tema central as barganhas políticas do deputado Frank Underwood (Kevin Spacey). Segundo o site Variety.com, aproximadamente 634.000 assinantes do serviço assistiram toda a temporada (13 episódios de 50 minutos) de House of Cards no primeiro final de semana. A trama complexa e os fortes pontos de virada reforçam o comportamento de binge-watching. Não podemos esperar isso de Marco Polo, cuja narrativa mais arrastada e cinematografia contemplativa nos fazem apreciar os detalhes e acompanhar as personagens sem muita ansiedade. Mas é de se esperar uma crescente complexidade na trama, envolta por ardis políticos e militares, costurados por um pouco de romance e a sensualidade das mulheres orientais. É um bom programa para assistir a qualquer momento. É como ter sempre disponível um grande filme para acompanhar a pipoca no domingo a tarde.

 

 

Featurette Marco Polo - Netflix

 

 

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