A consagração de Raul Bopp

O crítico Augusto Massi defende que a obra do poeta é central para entender o modernismo brasileiro


Luís Antônio Giron, do cmais+ Literatura

29/08/14 12:48 - Atualizado em 29/08/14 12:52

Raul BoppO escritor gaúcho Raul Bopp (1898-1984) é chamado por muitos críticos de “o poeta de um livro só”. O livro se intitula Cobra Norato (1931), um compêndio de poemas antropófagos que foram catalogados como significativos para a fase que seu amigo de movimento Oswald de Andrade denominou “a segunda dentição do Modernismo” – fase também chamada de Antropofagia. Assim, a fama de Bopp ficou limitada. Se ele foi companheiro de Oswald de Andrade e Mário de Andrade na Semana de Arte Moderna de 1922, logo seria esquecido, tanto porque trocou a carreira literária pela diplomática, como sobretudo porque não cultivou contatos literários. Figura aparentemente isolada, Bopp hoje é quase esquecido, mesmo que tenha vivido o bastante para ter publicado quatro livros e ter tido uma atuação cultural ativa ao longo de sua vida.

No entanto, para o crítico Augusto Massi, professor da Universidade de São Paulo, o lugar de Bopp é central no modernismo. Massi lança agora a segunda edição do volume Poesia Completa de Raul Bopp (editora José Olympio, 392 páginas, R$ 45), que ele organizou e anotou. O livro, marcado pelo esmero habitual de Massi em suas pesquisas, traz dezenas de poemas e textos raros e inéditos de Bopp. O objetivo de Massi desde que ele começou sua pesquisa em torno de Bopp, em 1992, é demonstrar que Bopp foi um poeta desbravador que uniu alta literatura e um conhecimento profundo da realidade brasileira e latino-americana.

O protagonismo de Bopp se dá especialmente na criação da Revista de Antropofagia (1928-1929). “Bopp merece ocupar o mesmo lugar que Mário e Oswald”, diz Massi. “Ele foi uma figura fundamental na criação e na edição da Revista de Antropofagia, e não um coadjuvante.” Não só isso. Segundo Massi, a leitura da obra de Bopp permite que o leitor entenda o modernismo de uma outra maneira: “Não é apenas o escritor estetizante que encara o primitivismo como um impulso lírico e experimental de recriar a mitologia brasileira. Bopp foi um homem cosmopolita, que estudou profundamente a cultura indígena e viajou à Amazônia antes mesmo de Mário de Andrade. Ele mostrou a realidade e a história em seus poemas.”

Diferentemente das ideias adquiridas sobre o modernismo, Bopp não foi um autor menor e eventual do movimento. Uma obra como Urucungo (1932), ele se equipara aos grandes poetas latino-americanos de seu tempo, como Huidobro, Girondo e Neruda. Ele foi além da brasilidade. Ele merece figurar entre os grandes poetas da América Latina.”

Foi um poeta desbravador, que, além de contemplar a paisagem, se embrenha na selva – e sai da expedição transformado, tanto no plano pessoal como no da linguagem. Nesse sentido, ele faria parte de uma linhagem de poetas que, de acordo com Massi, começou com Cláudio Manuel da Costa e continuou com Gonçalves Dias e os modernistas. “Bopp deu densidade e complexidade ao modernismo”, diz Massi. “É preciso rever o papel do movimento a partir da obra dele.”

Massi pretende escrever ainda dois livros sobre Bopp, um deles, talvez, a biografia desse personagem oracular do modernismo que, ainda em sua cidade natal, a pequena Tupanciretã (RS), publicava já em 1917 revistas que prefiguravam o movimento modernista. E que viajou pelo Japão (onde seus poemas foram publicados e elogiados) e pela África na época em que Oswald flertava com Paris e que Mário não saía de sua casa na rua Lopes Chaves, na Barra Funda, em São Paulo. O esforço de Augusto Massi deve ser reconhecido. Afinal, Massi tenta e consegue desautomatizar a história literária do Brasil, tão marcada pela mentalidade fixa e escolar.

 

O cmais+ é o portal de conteúdo da Cultura e reúne os canais TV Cultura, UnivespTV, MultiCultura, TV Rá-Tim-Bum! e as rádios Cultura Brasil e Cultura FM.

Visite o cmais+ e navegue por nossos conteúdos.

Comentários

Compartilhar


relacionadas